Há 59 anos, no dia 1° de abril de 1964, as Forças Armadas do Brasil instauraram a Ditadura Militar, período que durou 21 anos. O Golpe de 64, como é referenciado, é lembrado por ter sido um período de privação de direitos individuais, perseguição de opositores políticos, torturas, assassinatos e censuras. Durante 1964 a 1985, em número oficiais, de acordo com o relatório final da Comissão Nacional da Verdade, 434 pessoas morreram ou desapareceram. No entanto, a conjuntura autoritária da época instiga a pensar que os dados podem ser muito maiores.
Destas vítimas que foram assassinadas ou continuam desaparecidas, segundo o ANDES-SN (Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições do Ensino Superior), em levantamento feito pelo professor Milton Pinheiro, da Universidade Estadual da Bahia (Uneb), 106 eram estudantes universitários, 12 docentes e 1 técnico-administrativo do ensino superior.
Impacto na educação
Duas semanas após a tomada à força do poder em 1964, os militares empossaram o professor Flávio Suplicy de Lacerda, ex-reitor da Universidade Federal do Paraná (UFPR), como ministro da Educação. Lacerda tinha o intuito de transformar a educação superior brasileira em verdadeiros “escolões tecnocráticos”, com foco nas ciências naturais e exatas; reduzindo a presença das ciências humanas; desmontando o ensino gratuito e de qualidade através de privatizações, dentre outros.
Conforme palavras do ex-presidente militar Castelo Branco, o modelo educacional “serviria ao desenvolvimento nacional”.
Intervenções
As intervenções da ditadura não pararam por aí. Nos corredores das Instituições de Ensino Superior do Brasil também eram proibidas as maneiras de pensar e agir. Docentes, discentes e servidores sofriam frequentes perseguições políticas, prisões arbitrárias e demissões, além de serem impedidos de realizar reuniões sindicais e de buscar conhecimento em autores que não agradassem ao governo federal.
De acordo com o professor da Universidade de São Paulo (USP) Everaldo Oliveira, que é mestre e doutor em História Econômica, o autoritarismo na educação universitária resguardava o governo de sofrer críticas e serviu aos interesses capitalistas americano.
“Em primeiro lugar, (tinha o objetivo de) atacar a autonomia das universidades e impedir que se desenvolvesse uma ciência crítica que debatesse os problemas nacionais, que solucionasse os grandes entraves do desenvolvimento da economia brasileira, sob uma perspectiva democrática e com soberania nacional. Ou seja, a ciência deveria ser instrumental, deveria estar a serviço do capital. Subordinada cientificamente ao exterior e particularmente ao modelo desenvolvido pelos Estados Unidos”, explica.
Passado, presente e futuro
Além da imposição do que deveria ser estudado e pensado, os governantes escolheram arbitrariamente os reitores das instituições, como tentativa de controlar o ambiente. Este cenário durou até 1985, com a redemocratização do Brasil.
Atualmente, ainda é possível sentir os resquícios da Ditadura Militar na educação brasileira. Projetos como o Escola sem Partido, a implementação do Novo Ensino Médio e as sucessivas falas sobre a privatização das universidades públicas representam, respectivamente, a mordaça do pensar, a “tecnização da educação” e o desmonte do ensino gratuito e de qualidade.
Segundo Tiago Rodrigues, que é professor do curso de Licenciatura em Educação do Campo e do Programa de Pós-Graduação em Educação do Campo na Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB), o silenciamento sobre o tema ainda é um tabu que precisa ser superado.
“Penso que um desses reflexos (da repressão) seja justamente o silenciamento sobre o tema e deste período nas Universidades. Durante a ditadura, professores e estudantes foram perseguidos; sindicatos de professores e servidores foram proibidos de existir e, a vinculação da universidade com o povo foi impedida. A política não poderia ser debatida e discutida nesse espaço do saber, que são as Universidades. Isso, ao meu ver, aprofundou uma lógica falsa de que a universidade é neutra, é lugar de conhecimento técnico e não é o lugar da política. Isso ainda permanece hoje, pois na maioria dos currículos, a discussão política, a discussão sobre o passado, sobre o presente e sobre o futuro são silenciadas. A presença de movimentos sociais, como o MST, nas universidades é vista como algo não universitário, não acadêmico. Como disse, isso é fruto do autoritarismo da Ditadura Militar”, enfatiza.
Pelo não silenciamento deste período sombrio na história brasileira, hoje, recordamos o dia 1° de abril de 1964, para que os crimes cometidos durante a Ditadura não sejam esquecidos.