Na tarde da última terça-feira, 4, o ministro da Educação, Camilo Santana, anunciou a suspensão temporária do cronograma de implementação do Novo Ensino Médio. A decisão, que vale por 60 dias, aconteceu após consulta pública para reavaliar a estrutura política nacional. Camilo afirmou que o processo de implantação do Novo Ensino Médio foi “atropelado” e que “há muita reclamação de diversos setores”. O ministro citou o descontentamento de profissionais da educação, entidades sindicais e estudantis, alunos, pais, dentre outros.
O que é o Novo Ensino Médio?
A reforma do Novo Ensino Médio foi uma Medida Provisória (MP) aprovada durante o governo Michel Temer, em 2017. Já o cronograma de implementação foi uma portaria assinada em 2021 durante o governo Bolsonaro.
A proposta do governo Temer reformula o currículo, aumentando o número de horas nas escolas para 3.000, mas diminuindo a carga horária de matérias tradicionais.
Neste novo modelo, cerca de 1.200 horas compõem os chamados itinerários formativos, os quais são opções de currículo específico, que cada aluno deve escolher.
Os itinerários têm o intuito de levar o aluno rapidamente ao mercado de trabalho e ao ensino técnico.
A implantação deste modelo está ocorrendo em três fases, que começou no ano passado (2022), com o 1° ano do ensino médio, seguindo em 2023 com o segundo ano e em 2024 é a vez do terceiro ano.
Distorções
Apesar de ser uma tentativa ao ensino deficitário, o projeto é um modelo que pode criar graves distorções na educação, como o aumento da dificuldade dos estudantes em ingressar no ensino superior, por exemplo.
De acordo com o presidente da APUR, professor Arlen Beltrão, é enganoso o pretexto de que os itinerários formativos melhorarão a vida dos estudantes.
“Primeiro é preciso destacar que a reforma do ensino médio representa um retrocesso na educação básica brasileira porque desconfigura o próprio entendimento de básico, instituído na Constituição e na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), tendo em vista que as redes não terão mais a obrigatoriedade de oferecer uma carga horária mínima na formação comum, já que foi alterada a carga horária destinada a BNCC. Antes esse mínimo representava 2400 horas, hoje, ao invés de ter o mínimo, tem o máximo de 1800 horas, ou seja, a depender das circunstâncias e do interesse da rede, a carga horária pode ser menor que 1800 horas.
Além disso, há uma tendência de secundarizar o conhecimento científico no currículo, dando relevância e privilegiando o desenvolvimento de competências. Além disso, é possível apontar que a reforma leva os estudantes a se especializarem precocemente. Nós teremos uma especialização precoce sobre uma base precária”, explica.
Impacto na UFRB
Ainda conforme Arlen Beltrão, o Novo Ensino Médio deve impactar negativamente as universidades federais, em especial a Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB).
“Há uma sobrecarga de trabalho dos professores, há um deslocamento dos professores para áreas que não são as específicas. Os professores tenderão a ministrar componentes curriculares distantes da formação e há uma redução importante da carga horária de componentes curriculares indispensáveis, imprescindíveis, como química, biologia, educação física, sociologia e filosofia. Isto é, quando estes componentes curriculares não estiverem fora do currículo, o que é pior.
Teremos como resultado a tendência de aumento da desigualdade educacional porque as escolas particulares manterão esses componentes curriculares de caráter propedêutico. Já as escolas públicas deverão reduzi-los. Em troca, vêm incorporando atividades ou disciplinas eletivas como fazer brigadeiro, empreendedorismo, que pouco podem contribuir para a formação qualificada dos estudantes. A gente vai ter um quadro de maior dificuldade nos alunos que queiram acessar à universidade pública, como a UFRB.
E no nosso caso, que recebemos prioridade de estudantes filhos da classe trabalhadora, estudantes pobres, na sua maioria provenientes das escolas públicas, teremos também o desafio da permanência. Já que esses estudantes tiveram as condições retiradas de terem tido uma formação de nível médio melhor. Com efeito, eles vão enfrentar maior dificuldade em cursar os respectivos cursos” .
Suspensão e revogação
A APUR concorda não só com a suspensão, mas também pede pela revogação do Novo Ensino Médio, por entender que esta reforma não atende aos interesses educacionais do povo brasileiro. Desta forma, reiteramos nosso apoio às manifestações convocadas pela União Brasileira dos Estudantes Secundaristas (UBES), que ocorreram no último dia 15 de março, e às reivindicações da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), que serão debatidas na 24ª Semana Nacional em Defesa e Promoção da Educação Pública, nos dias 23 a 28 de abril.